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quinta-feira, 14 de outubro de 2010

Exemplo de Entrevista

Lula fala ao iG sobre seus planos para depois da Presidência

Eduardo Oinegue, Luciano Suassuna e Tales Faria | 17/09/2010 11:02



"E depois de algum tempo, a gente, então, cai a ficha. Você está fora, já não tem mais o Franklin, não tem mais o Giberto Carvalho que eu xingava, não tem mais ninguém. Não tem mais o Stuckinha para eu berrar com ele. Aí eu vou querer uma fotografia, não tem, vou ter que ir lá numa dessas, como chama? Ótica, tirar uma daquelas de trinta segundos.

Então, quando essa ficha cair aí eu estou preparado para tocar a vida. Eu não quero nem tomar decisão antes de alguns meses, porque eu não quero tomar decisão errada. Então eu tenho que maturar, calejar, para depois tomar decisão.

Quando eu deixar a Presidência da República, eu quero ser chamado de companheiro Lula. Eles que me chamaram de companheiro Lula, antes de eu ser presidente da República. Essa para mim é a maior conquista que eu vou ter na minha vida. E eu tenho a convicção que eu vou ser tratado com carinho na porta da Volkswagen como era tratado nas greves de 80. Eu tenho a convicção que eu vou ser tratado num congresso da Contag como eu era tratado quando eu era oposição. Essa coisa está no sangue. Eu sei meu lado. Sei da minha obrigação como presidente que eu tenho que governar para todos. Eu tenho que tratar o mais rico igual eu trato o outro.

Todo mundo tem direito de cidadania. Agora, eu tenho que governar tentando favorecer os mais pobres. Mas quando eu deixar a Presidência eu sei para onde eu vou. Sei quem são meus companheiros, sei quem vai lembrar de mim. Sei quem vai lembrar quando eu fizer aniversário. Eu não me iludo. Eu não me iludo. A política para mim foi uma lição de vida. Não é por orgulho não, isso aqui é um comportamento. Apenas uma linha de comportamento. Eu vou deixar o meu mandato sem nunca ter precisado almoçar ou jantar com rádio, televisão ou jornal. Coisa que era habitual nesse país.

A turma aqui dizia 'Põe o presidente para almoçar com o dono da televisão. Agora o presidente vai almoçar com os donos dos jornais'. Desse mal eu não sofrerei. Eu tenho que me preparar psicologicamente para isso. Não é fácil eu ter a vida que eu tenho e no dia 2 de janeiro do ano que vem eu levantar no meu apartamento, não ter mais os meus filhos porque todos dormem fora. Eu e Marisa. Não ter o César para eu chamar ele e xingar por causa da agenda. Não tem mais o Stuckinha para eu berrar com ele. Não ter o Gilberto Carvalho para me xingar por alguma coisa.

Não ter esses meninos para me dar o briefing de manhã aqui, o que a imprensa está falando o que é que você tem que falar amanhã, como é que a imprensa tá se comportando. Eu não olhar para a cara da Marisa, ela não olhar para a minha cara. Eu estou me preparando para isso."

iG - O senhor quer uma viagem? 

"Mas eu quero ficar um tempo sem viajar"

iG - Do que o senhor vai sentir mais saudade? É da agitação? O Fernando Henrique tinha falado que ia sentir saudade da piscina do Alvorada.

"Ele disse que ia sentir saudade da piscina e do helicóptero. Eu não vou sentir saudade de nenhum dos dois. Eu acho que eu vou sentir saudade da agitação do cargo. Eu lembro de quando eu fui preso e voltei para o sindicato, eu tava cassado. Eu levantava de manhã e ficava igual uma barata tonta. Eu não tinha para onde ir.
Eu virei para o meu lado e disse uma coisa que é uma coisa verdadeira. Ex-presidente é que nem vaso chinês. Quando você está no Palácio, você tem muito lugar para colocar o vaso chinês. Mas quando você sai, você estar num apartamentozinho você não tem onde colocar o vaso chinês. O que você faz com o vaso chinês? Um ex-presidente é sempre um vaso chinês. O que você precisa tomar cuidado é para não atrapalhar os outros, ou seja, tem que deixar espaço para os outros.

É por isso que eu não quero tomar nenhuma decisão precipitada. Eu quero primeiro saber aonde é que vai doer. Eu quero voltar a ver jogo do Corinthians no Pacaembu, de preferência junto com a Gaviões ali, com a camisa do Corinthians. Sabe, então eu quero voltar a ser um cidadão normal."


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